Texto retirado do livro Técnica, Espaço, Tempo
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Vivemos em um mundo onde já não temos comando sobre as coisas, já que estão criadas e governadas de longe e são regidas por imperativos distantes, estranhos. Poderíamos, nesse caso, dizer, como Maffesoli, que os objetos já não nos obedecem, uma vez que eles respondem à racionalidade da ação dos agentes. No dizer de Sartre de A imaginação, os objetos se tornam sujeitos. Mas nenhum objeto é depositário do seu destino final e não há razão para um desespero definitivo. Num mundo assim feito, não cabe, a revolta contra as coisas, mas a vontade de entendê-las , para poder transformá-las. No século em que a Revolução Industrial se afirmou, essa revolta se dava como luta contra as novas invenções, vontade de destruir as máquinas, como no ludismo.
Hoje, sabemos que tal revolta tem de se dar contra as relações sociais inegualitárias, que esses objetos permitem. O que se impõe é conhecer bem a anatomia desses objetos e daquilo que eles, juntos, formam: o espaço.
É pelo entendimento do conteúdo geográfico do cotidiano que poderemos, talvez, contribuir para a necessária teorização dessa relação entre espaço e movimentos sociais, enxergando na materialidade, que é um componente fundamental do espaço, uma estrutura de controle da ação, um limite ou um convite à ação. Nada fazemos hoje que não seja a partir dos objetos que nos cercam. Não há, todavia, por que desesperar, já que a vida das coisas não é dada para todo sempre. Se estas podem permanecer as mesmas na sua feição rígida, alteram-se, ao longo do tempo, seu conteúdo, sua função, sua significação, sua obediência à ação. As determinações mudam, mudando os objetos. As ações revivificam as coisas e as transformam.
O conhecimento dos objetos e dos seus processos passa a ser fundamental para uma ação deliberada e renovadora, e o papel da geografia também se renova, na análise social e na construção do futuro.
Grifos nossos.
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